16/10/2010

Ai ai,as percentagens…

As médias que muitos automobilistas fazem mentalmente são ilusórias – e erradas
            Numa revista de informática, anuncia-se um novo microprocessador que incrementa a velocidade de computação em 50%, “permitindo pois diminuir o tempo de trabalho para metade”. Parece fabuloso. Mas estarão as contas certas? Um aumento de velocidade em determinada percentagem implicará uma diminuição do tempo em percentagem equivalente?
            Suponha o leitor que vai de Lisboa ao Porto à pacata velocidade de 50Km/h. Se da vez seguinte viajar a 75Km/h, aumentando pois a sua velocidade em 50%, julga que iria reduzir o tempo do percurso em 50%? E se passasse a viajar a 100Km/h, aumentando pois a sua velocidade em 100%, julga que iria reduzir o tempo do percurso em 100%? Isso seria realmente excelente, pois demoraria zero horas, zero minutos e zero segundos de Lisboa ao Porto. Ainda melhor então seria aumentar a sua velocidade em 150%. Neste caso, poderia chegar antes de ter partido… 
            Basta fazer as contas para se perceber que isto está tudo errado. Quando se viaja a 50 Km/h, demora-se seis horas a fazer o percurso de Lisboa ao Porto, que são 300 Km. Quando se passa para 75Km/h, aumentando a velocidade em 50%, demora-se quatro horas, ou seja, reduz-se o tempo de viagem em um terço (33,3…%). E quando se passa para 100Km/h, aumentando a velocidade em 100%, demora-se três horas, ou seja, reduz-se o tempo de viagem em 50%.
            É por isso que as médias que muitos automobilistas mentalmente fazem são ilusórias e incentivam à ultrapassagem inútil dos limites de velocidade. Se formos de Lisboa ao Porto e fizermos metade da viagem a 100Km/h e outra metade a 150Km/h, por exemplo, a nossa velocidade média não é 125Km/h, como poderia à primeira vista parecer, mas apenas120Km/h. Faça o leitor as contas: a duração total da viagem seria 2,5 horas, o que equivale à média de 120km/h.
            Para calcular a velocidade média não se pode pois fazer uma simples meda aritmética, como para medir o peso médio de um conjunto de laranjas, por exemplo. O mais simples será fazer as contas. Mas quem quiser fazer um a média, terá de usar a chamada média harmónica, que é o inverso da média dos inversos. No nosso caso, teria de se calcular (1/100+1/150)/2, que é igual a 0,0083…, e depois calcular o inverso, que é 120.
            Há uma relação curiosa entre a média aritmética e a média harmónica. A segunda é sempre menor que a primeira, excepto quando os valores de partida, no nosso caso as velocidades, são iguais. Isto confunde os automobilistas, que fazem mentalmente médias aritméticas. Estimam então ter aumentado a sua velocidade média num valor que é irrealista. Na prática, quando o trânsito está denso, de pouco vale acelerar loucamente durante os curtos intervalos em que a estrada está desimpedida. Imagine o leitor, por exemplo, que faz a viagem de Lisboa ao Porto sempre à velocidade de 100km/h, excepto num troço de 50km em que acelera que nem uma bala, atingindo os 200km/h. No final da viagem, a sua velocidade média ficou um pouco aquém dos 110km/h. Terá valido a pena todo o esforço e risco?
            Agora que lançámos a semente da desconfiança do leitor, sugerimos que faça as contas e verifique se este anúncio de uma companhia telefónica faz sentido: “Fale agora 50% mais, com o preço por minuto reduzido para metade”. Verificará que a companhia se enganou contra si própria. Com uma redução de 50% no preço, pode-se falar 100% mais tempo com o mesmo dinheiro. Também para o “marketing”, é conveniente saber fazer contas
                                       Nuno Crato( Expresso 23 de Abril 2005/ÚNICA 105)

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